sábado, novembro 22, 2003

 

O Sr. Correia, a sua mulher, a comadre e o motorista [ou a comadre do motorista] (3)

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A vizinha comadre [ou o momento]

A consulta ia acabar, já eu olhava para o próximo processo, quando o Sr. Correia se remexia na cadeira. Parecia com pouca vontade de sair.
- Hum… doutor… só mais uma coisa, posso?… - meio tímido
Que mais?… enfim.
- Diga lá, Sr. Correia… - disse o Bruno, solicito
- É que… como eu disse, isto da minha mulher deixou-me muito abalado, como disse.. mas já passaram dois meses… e há uma coisa – redondeava.
- Sim…
- Pronto, uma pergunta… posso tomar Viagra? – atirou.
…Olá, donde viria esta? O Bruno ficou novamente mudo.
- É que tenho lá uma caixa que o meu médico me passou… mas tenho este problema… e também sofro do coração, como o doutor bem sabe…- arrebitou.
- Oh Sr. Correia… mas porquê isso? – peguei eu a ver o que saía.
- Bem, doutor… É que eu temho uma vizinha! Está a ver, já passaram dois meses… Ela até é minha comadre, sou padrinho do filho dela… mora alia o lado, e o marido é motorista… um bom moço… e está muitas vezes for a! – atabalhoado.
- E?…
- Bem, doutor, desculpe lá isto… desculpe!… Mas ela ajudou-me muito nestes últimos meses e depois da minha querida esposa partir, estou muito só… Ela ajudou-me muito! Muito mesmo! - continuava
- …
- Há dias, na semana passada… até fui eu que fui levar o marido a Loulé, que ia para uma viagem… Estive a falar com ela, à tardinha… e disse-lhe que ia fazer-lhe uma visita depois do jantar… e ela disse que sim. Ela também gosta de mim. – contente.
- Sim homem… e o que tem o Viagra?… - já impaciente.
- É que eu já tenho esta idade… não sou velho, doutor… mas ela é mais nova… não sou velho! Decidi tomar um da caixa que lá tinha.. antes de ir – brilhante.
Deviamos estar os dois de boca aberta, meio aparvalhados. Este era o homem que há menos de cinco minutos nos chorava o sofrimento e a morte da esposa. Podia-se dizer que depois da tristeza do espírito vinham as alegrias da carne.
- Mas fiquei ali… e não senti nada… está a perceber, doutor… nada! Não sei porque foi, mas aquilo não funcionou e acabei por não ir fazer a visita! – novamente triste.
Incrível! Incrível e desconcertante. Tinha ali ficado à espera… O Bruno continuava mudo, eu pasmado sem saber bem o que dizer.
- Ora Sr. Correia… - vamos lá improvisar!
- Desculpe lá isto, doutor… sei que não é da sua área…
- Nada, deixe lá!… Bem, duas coisas. Primeiro, antes de tomar Viagra tem que falar com o Dr. Veloso… só ele lhe pode dizer se com o seu coração e os medicamentos que toma não tem nenhum problema, okay? – discursei
- Sim, doutor… muito obrigado!
- Depois… o Viagra não funciona assim, homem! Não o põe logo ali pronto a matar. Tem que tomar, ir lá fazer a visista e ver o que acontece… e aguntar-se ao que vier… - sorri.
- Ai é, doutor?… é que eu pensava que… - brilhava novamente.
- É, Sr. Correia… vá lá, homem! Se tem a certeza que a comadre está a sua espera, vá lá… se calhar nem precisa de Viagra! – terminei.
Agora era todo sorrisos, qual criança que descobriu um segredo de crescidos. O Bruno sorria e abanava a cabeça. Eu também sorria mas continuava pasmado. Um algarvio nato… aquela tristeza toda com a morte da esposa, genuína, pois até chorou e nos comoveu, e acabamos a engolir Viagras para ir papar a vizinha. Ora, ora…
A consulta acabou, quem baralhou as cartas?

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