domingo, maio 29, 2005

 

A puta da cólica

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Na noite de sexta para sábado o meu rim esquerdo voltou a dar sinal: uma pequena moinha foi, insidiosamente, fazendo-se notar. Um Voltaren, ao deitar, acalmou a coisa… A partir das onze da manhã de sábado a sacana voltou e começou a apertar, e já não era moinha nenhuma, era uma cólica de excelente intensidade. Mais Voltarens e uns Dol-u-rons foram aboborando a maldita mas, durante um jogo do Manel, já estava que não podia.
Após o jogo lá fui fazer uma visitinha ao hospital: apanhei um chuto de Tramadol (na veia) e outro de Diclofenac (no rabo). Pensava eu que essa tinha sido a pior altura: mesmo antes de levar as milagrosas injecções, a dor atingiu picos quase insuportáveis e soltava "aiiiis" bem sonoros… Parecia-me que um qualquer ovo de galinha queria passar, a toda o vapor, pelo baixo ventre adiante.
Aliviada a crise, vim para casa, meti-me numa banheira cheia de água quente e pensei que o pior já tinha passado.
Pois… eram quatro da manhã e já guinchava outra vez. Agora era uma dor excruciante, agora parecia-me que o ovo era de avestruz e que forçava a saída sei lá por onde. Em desespero, pedi à Nela "dá-me uma injecção de Voltaren…" Dada e a injecção e tomado um Tramal, andei às voltas pela a casa e acabei por cair, exausto, no sofá. Acordei hoje, de madrugada, são e salvo…

Entretanto, ontem fiz uma nova ecografia: ainda tenho os rins cheinhos de pedritas e a maior, com 6 mm, ainda não caiu…
Não quero pensar nisso!

domingo, maio 22, 2005

 

O que ela queria

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Mas o que é que ela fazia ali?
Das três vezes que a miuda desceu, para realizar a colonoscopia, lá estava ela… Entrava discreta e calada, mas de porte altivo e distante… ar de professora, disseram. Também me disseram, depois, que aquele pescoço, execessivamente hirto e esticado, se devia a uma qualquer cervicalgia crónica. Talvez… Proferia poucas palavras e parecia pensar muito. Parecia…

O que é que ela quereria?
Não tinha, directamente, nada a ver com o caso clínico, não percebia nada do que nós ali faziamos, nunca ajudou em nada nem emitiu qualquer opinião válida. A doente era uma criança de 6 ou 7 anos com o banal pólipo do recto (presumivelmente juvenil) para retirar endoscópicamente. E, ainda por cima, sentava-se sempre na minha cadeirinha preferida, onde costumava ficar descansado a observar os avanços e recuos dos internos. E eu lá ficava em pé, ou sentava-me nas escaditas da maca…

Sim, que quereria ela?
Soube depois… bem, de facto, podia ter logo desconfiado. Das poucas palavras que disse, nas três vezes que lá esteve, foi qualquer coisa como "já estão a gravar?" Sim, era uma interna, e alguém lhe tinha dito que este caso era muito interessante, deveras raro e que se devia "pegar nele". Pegar nele queria dizer gravar imagens e escrever uns rabiscos para futura publicação, claro!

Pois, era isso que ela queria!
Quando soube, pensei "Olhamesta!" Talvez por isso, na terceira vez que a criança lá foi e em que se tirou o pólipo, aquando da habitual pergunta dela "já estão a gravar?" eu respondi seco "ainda não há nada para gravar!". Nesse momento a imagem no écran era uma mancha de caca agarrada à lente. Depois, a cassete ficou lá. Deve pensar que nós a guardamos para ela. Se calhar, que nós até a editamos! Pois, talvez grave qualquer coisa por cima… por distracção!

E porque é que criança lá foi três vezes, para uma coisa tão simples?
Porque embirarram que não haveriam de fazer a preparação correcta. No primeiro dia, os pais (verdeiramente chatos!) e no segundo dia, os enfermeiros do Serviço de Pediatria. Tinham-me telefonado para confirmar as indicações de preparação – na folha estava escrito que não se aplicava a menores de 12 anos – e eu confirmei a prescrição. E sosseguei os pais…
Mesmo assim, na segunda vez que lá foi, continuava cheia de fezes que impediram a polipectomia. Estranhei, fui ver o processo clínico e lá estava: não tinham feito a preparação indicada, tinham-se limitado a dar 2 micro-clisteres...
Enfureci-me e escrevi no diário, em letras garrafais:

A DOENTE NÃO FEZ A PREPARAÇÃO PRESCRITA E CONFIRMADA ORALMENTE À SRª ENFERMEIRA. AGRADECE-SE QUE SÓ REENVIEM A PACIENTE QUANDO FIZER A PREPARAÇÃO ADEQUADA PARA COLONOSCOPIA COM POLIPECTOMIA.

Houve borburinho, recebi telefonemas indignados mas, no dia seguinte, lá estava a criança bem preparada!

Adenda: Vamos lá... é desta!

quarta-feira, maio 18, 2005

 

O caminho é em frente

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O Benfica ganhou!
Ganhou o jogo ao Sporting... aos lagartões. Estive lá e gostei!
Ainda não ganhou o campeonato... Isso, é só no próximo domingo!

Morreu a D. Amélia.
Convivi com a D. Amélia, quase todos os dias da semana, durante mais de 6 anos. A proximidade que se vai criando entre as pessoas, numa sala de endoscopia, é enorme... quase sem se notar.
Era doente, já sabiamos... há coisa de 2 anos, durante uma sessão de endoscopia começou a ficar de boca ao lado e com a fala atabalhoada. Queria continuar a trabalhar mas obrigámo-la a ir á urgência... era um AIT.
Reformou-se há cerca de 6 meses, por invalidez, depois de andar mais de 1 ano de junta em junta à espera do veredicto final. Estive com ela na passada semana e brinquei - Ora agora é que vai ser gozar essa reforma! - mas ela parecia abatida - Não doutor... ando um bocado em baixo!
Ontem chegou à urgência, novamente com sintomas de AIT. Passado umas horas, a D. Amélia morreu. Amanhã vou ao funeral.

quinta-feira, maio 12, 2005

 

Doente e Doentes

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Apesar de continuar em modo Benfica, praticamente em piloto automático, volto aqui porque aconteceram algumas coisas importantes. De repente, descobri-me... doente. Sim, passei-me para o outro lado!

Há coisa de 10 dias, mais ou menos, comecei a sentir uma leve dor, quase um misto de desconforto e ardor, no fundo das costas. Bem, não era bem no fundo das costas, era um bocadinho mais abaixo... já em pleno sulco inter-gluteo. Sim, isso mesmo... lá mesmo em baixo, junto ao cóccix! Passado 2 dias, e como a dor não passava, durante um banho pus-me a explorar - Porra, um inchaço... e, o que é isto??... um recesso, um orifício?? - Já com uma forte suspeita "fui-me mostrar", nesse dia, ao cirurgião. Veredicto: quisto dermoide sacro-cóccigeo.
Pois, não basta o embaraço de isto ser uma doença de putos, ainda vou ter que ser operado para retirar a porra do quisto. A cirurgia até é simplória mas a recuperção é demorada e bastante incómoda: retiram o quisto e deixam cicatrizar por segunda-intenção ou, dito de maneira mais directa, deixam ficar o buraco aberto (em "carne-viva") e vai fechando, lentamente, durante um mês ou mais. Já me contaram, detalhadamente, as peripécias de quem passa por isto!

Como se não bastasse o quisto, parti um dedo a jogar futebol... no aquecimento! Fracturei a 3º falange do 4º dedo da mão esquerda, na insersão do tendão extensor. Agora uso uma linda tala de Stark, para manter o dedo esticado, e ando meio coxo da mão esquerda. Coisa para 2 meses, disseram-me.

Entretanto, conheci o senhor Santos.
O Sr. Santos tem 84 anos e é um velhote catita. Foi ter comigo porque tem dois tumores do intestino grosso: um no cólon descendente, claramente maligno, a requerer cirurgia sem qualquer dúvida; o outro é (ou era) um enorme tumor viloso do recto, provavelmente ainda benigno (ou só com alguns focos malignos...). O problema é que este segundo tumor está (estava) situado logo acima do canal anal e uma cirurgia implica a amputação do ânus, com encerramento deste e colostomia definitiva (o saquinho!). E o senhor Santos tem 84 anos, e é catita, e não quer nenhum saquinho.
Explicadas as opções e conhecendo os riscos, avançámos para a chamada mucosectomia endoscópica: remover, por via endoscópica, em bloco ou em fragmentos, o dito tumor viloso do recto. Só que era o maior tumor deste tipo que eu já vi e, quando comecei o procedimento, não me apercebi da sua real extensão. A mucosectomia em fragmentos prolongou-se por 3 sessões, em 3 dias, e enchemos 3 frascos para análise. Passo a passo, bocado a bocado, lá fomos desbastando a besta e hoje, ao fim de mais de 4 horas (totais) de árduo labor, apresentava uma extensa úlcera no local onde morava o tumor. Enfiei o tubo mais de cem vezes naquele rabo... Fui conhecendo o senhor Santos.
- Então doutor, agora que está a acabar diga-me lá... Está satisfeito?
- ... Não completamente, estou convencido que existe ali uma ponta que não foi completamente removida.
- E então?
- Daqui a 15 dias revemos e logo se vê. Podemos retirar o resto...
- E é maligno?
- Este não sabemos... Não me parece, mas só a análise é que nos vai dar a certeza.
- ...
- Mas o outro, aquele lá de cima é... E precisa de ser operado.
- E já tenho metástases no fígado?
- Não... os exames não mostram nada!
- ...
- Voltamos a ver-nos no dia 24 e aí, combina-se tudo com o cirugião.
- Está bem, doutor!
- Desta parte já está safo...
- Isto tudo foi da vida que levei...
- Naaa, acho que não... Mas desde que tenha valido a pena, senhor Santos...
- Valeu... doutor, valeu!

quinta-feira, maio 05, 2005

 

Interregno

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A partir deste momento entro em modo Benfica!
Por isso, e até dia 15, é pouco provável que produza alguma coisa de jeito.
Para quaquer assunto, que não seja de saúde, estarei ali do outro lado...

 

O Hospital

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A ser verdade, o nosso Filósofo tomou uma boa decisão: por agora, o tão falado novo Hospital Central do Algarve, no Parque nas Cidades, não vai em frente.
Esta é a minha opinião, bastante minoritária, diga-se em abono da verdade. Autarcas, sociólogos, politólogos, médicos, influentes locais e população em geral, todos em uníssono, clamam pelo novo Hospital. Mesmo agora veio a avestruz Macário Correia (sim, ainda não é dinossauro... só avestruz), qual porta-voz da AMAL, arengar contra tamanho dislate do governo. Faz-me muita impressão que pessoas, sem o mínimo de conhecimentos técnicos sobre organização hospitalar, opinem de alto ao sabor das vontades políticas.
O que eu penso é que um Hospital Central não é construido de raiz. Não se "faz" um Hospital Central. Este vai-se fazendo, é uma longa evolução funcional, e a determinada altura, em função da diferenciação adquirida e das valências que possui, passa a ser denominado Hospital Central. Foi o que se passou em Braga, no Hospital de S. Marcos. Ao hospital onde eu trabalho só lhe faltam 2 ou 3 valências para ser um verdadeiro "Central", e tem recursos humanos abundantes e sub-aproveitados. É só continuar a trabalhar para vir a sê-lo... As instalações já vão estando obsoletas... ok, mas está-se a investir nesse aspecto e mais pode ser investido e modernizado.
Por outro lado, ao fazer um hospital novo, todo bonito, todo equipadinho, passa a faltar o mais importante: os profissionais para lá trabalhar! E onde se vão buscar? A este... então este fecha, ou ficam os dois deficitários. A Lisboa? Sim, pois... se houve sempre grande dificuldade para trazer gente cá para baixo, era agora por milagre que viriam 2.000 profissionais de uma só vez. Só se for a Espanha... ok, tudo bem! Quanto a mim, nesta região, o que falta são hospitais mais pequenos - chamados de Nível 1 - com as ditas valências básicas, e a funcionarem eficazmente... não como o único, desse tipo, que aqui existe e é uma aberração. Por exemplo, Tavira era um excelente local para um hospital desse tipo, e deixava o Macário (a avestruz) todo contentinho.

Mas, como gosto sempre de dar uma no cravo, outra na ferradura, aqui fica:
Mais uma vez assistimos ao habitual fólclore governativo portugues: Uma decisão de um governo anterior é alterada pelo novo governo, de repente, sem ser apresentada uma explicação ou um substrato que o justifique. Ou seja, porquê sim aos outros cinco e não a estes cinco que foram chumbados?